Sobre justiça, liberdade e imparcialidade

Julio Cesar Prava
4 min readApr 28, 2024

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As pessoas estão há séculos discutindo o que é certo e errado, o que é justo e injusto e o que é liberdade, mas a maioria delas acaba esquecendo do básico: o limite é o outro. Eu não posso fazer mal para alguém para me beneficiar, assim como alguém não pode me fazer mal para se beneficiar, nisso reside a justiça e a liberdade, afinal, não há justificativas baseadas na razão e na imparcialidade para ir em sentido contrário.

Ainda que me pareça simples compreender isso e que possa ser para qualquer um, aqueles que são considerados os maiores pensadores de todos os tempos deram suas versões que nunca consideram o outro igualmente, sempre tentando dar peso maior aquilo que eles preferem. É irônico que os cânones do pensamento humano não conseguiam ver o mínimo, mesmo aqueles especializados em ética, um bom exemplo é que cediam as normas culturais de seu tempo que prejudicavam os outros.

Em todos os tempos as pessoas acreditaram em liberdade e justiça de uma forma conveniente para elas, mas nós temos que levar a sério essas ideias. Por isso precisamos parar de tentar barganhar conceitos como liberdade e justiça. Não há justiça tendenciosa. Se uma escolha prejudica alguém podendo ela não ter prejudicado ela não é uma escolha justa. Se a ‘liberdade’ de alguém prejudica o outro, ela viola a liberdade do outro, então não é liberdade. Se temos escolhas que não tem as melhores consequências possíveis elas não são as melhores escolhas.

As nossas escolhas precisam colocar os outros de maneira igual à nós em tudo aquilo que são iguais. Precisamos considerar aqueles interesses que são semelhantes dos outros indivíduos de maneira semelhante, não tendo dois pesos e duas medidas. Cada ser senciente é alguém, é o outro. Os animais de outras espécies que sofrem, não deveriam sofrer, assim como nós humanos. Nós devemos evitar isso, não há razões justas ou livres para prejudicar eles ou mesmo para não ajudá-los, aqueles que insistem em fazer isso sempre partem de visões parciais, auto-interessadas e convenientes que ignoram esse outro, não é liberdade, não é justiça.

Ainda hoje, a maioria esmagadora das pessoas acredita que a liberdade é uma via de mão única, onde ser oprimido significa ter sua liberdade roubada, enquanto oprimir os outros é visto como um exercício genuíno de liberdade, o que é uma visão de liberdade completamente falsa. Esse é o caso quando as pessoas não são veganas e antiespecistas.

Pensemos em quão limitada é a liberdade dos liberais e dos marxistas que exploram os animais. Os liberais ignoram o bem e a liberdade individual de muitos indivíduos, os marxistas exploram a força de trabalho e os corpos dos muitos indivíduos. Os utilitaristas que colaboram com a exploração e a matança de animais não estão buscando o mundo com menor sofrimento possível, os teóricos de direitos estão ignorando os interesses básicos que os humanos e os animais desejam igualmente e os direitos relativos à eles. Os igualitaristas estão sendo desiguais. Os racionalistas estão sendo tendenciosos, enviesados e irracionais, cegos pelo antropocentrismo moral. Todos eles estão violando os princípios que dizem defender quando prejudicam os animais, pois traçaram uma linha arbitrária extremamente tendenciosa, que só é justificada diante do egoísmo, mas que nunca tem força diante da imparcialidade e do limite do outro.

Todos os especistas estão ignorando a individualidade de cada animal, a subjetividade, os interesses deles que são iguais aos nossos, relacionados ao bem-estar físico e psicológico. Isso inclui aspectos como ser livre da dor e do sofrimento, ter livre expressão de comportamentos naturais, vivenciar condições adequadas às suas necessidades e a diversos outros fatores que contribuem para uma vida plena e saudável. Eles ignoram para o outro boas existências, eles inclusive, prejudicam as existências dos outros.

Explorar animais é irrefutavelmente errado, não ajudá-los o tanto quanto pudermos também. Um mundo justo e livre é inclusivo, e inclui todos os seres que são capazes de sofrer e de desfrutar, de ter experiências, que são alguém e não algo, todos os seres sencientes. Nós precisamos proteger os mais vulneráveis ao invés de explorá-los e deixá-los a mercê. Se queremos ser justos, nós precisamos nos importar com o outro e respeitá-los em si mesmos e se queremos ser livres precisamos ajudá-los sem pensar em ter benefícios para nós.

Justiça e liberdade incluem o outro, nunca são uma via de mão única. Esses conceitos devem ser inclusivos e considerar todos os seres capazes de experimentar o mundo, sem negociações. Se você não percebe isso a sua versão de liberdade e de justiça é sua maior prisão, independente do quanto você lute para tentar racionalizar e justificar isso. Não dá para justificar o injustificável, ou parcializar o imparcial. Se você quer um mundo justo talvez precise abrir mão de muita coisa que pode ser importante pra você, mas faz parte da liberdade tratar o outro com respeito, sempre.

A razão é atemporal, quase sempre soubemos quem são outros e que eles podem ser prejudicados. Ao longo da história foi ignorada a liberdade de outros humanos e eles foram oprimimos por características irrelevantes. Os animais também são indivíduos que podem ser prejudicados e também foram, e ainda são ignorados, tendo seu bem violado, também por características irrelevantes. Nós sabemos disso e nós somos conscientes das consequências de nossas escolhas. Podemos considerar cuidadosamente como elas afetam outros seres sencientes. Como agentes morais nós temos responsabilidade em nossas decisões, não dá para negar. Um aspecto importante da natureza humana se traduz na frase do Tio Ben: grandes poderes, grandes responsabilidades. Nós temos grandes responsabilidades com os outros, e os animais são outros.

Se você ainda tenta criar desculpas para deixar de explorar e ajudar os animais acesse o site senciencia.org

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